2015 – O Ano que não começou

2015 – O Ano que não começou

Após um ano do segundo turno da eleição presidencial não houve um momento de calmaria. Parece que o ano 2014 ainda não terminou, pois o debate da campanha eleitoral ficou mais acirrado, mas por outro lado, a deterioração do quadro econômico, político e a crescente insatisfação popular nos levam a pensar que o ano 2014 ocorreu há uma década. Para entender este processo, é necessário visualizar as mudanças no cenário político-econômico internacional, começando pela crise iniciada em 2008 nos EUA, que atingiu a União Europeia em 2010, chegou aos BRICS (China, Rússia, Índia, Brasil e África do Sul) e, em diferentes graus, nos países emergentes da América Latina em 2014, sendo, nestes últimos, quase sempre acompanhada de crises políticas.
 
A partir dessa crise, tanto a China quanto os EUA, começaram a alterar os termos de sua relação de troca com os demais países do mundo, reduzindo e/ou invertendo o fluxo de capital e diminuindo a sua demanda pelos produtos primários dos países emergentes, o que provocou uma acentuada queda de preços das commodites no mercado internacional. As consequências destas medidas foram agravadas pelos limites exibidos pelos governos progressistas instalados a partir de 2002.  Considerados como tal pelo desejo de superação da hegemonia neoliberal, em maior ou menor radicalidade, contudo, atuaram nos marcos da hegemonia do capital financeiro e transnacional, procurando “janelas de oportunidades” comerciais e de investimentos externos. De maneira muito simplificada, a “janela” estava apoiada nas necessidades e interesses econômicos dos Estados Unidos e da China, que geraram uma forte demanda por commodities, fornecidas, entre outros, pelo Brasil.
 
Neste cenário de crise, o governo brasileiro reagiu bem: mais mercado interno, mais integração regional, mais Estado. Porém, devido a uma estratégia de conciliação adotada pela maior parte da esquerda brasileira, o Brasil foi um dos países que não realizou as reformas estruturais, que permitisse, por exemplo, o desenvolvimento de uma indústria forte e tecnologicamente avançada. Além disto, não constituímos um setor financeiro poderoso e público, fundamental para o desenvolvimento de projetos que deem retorno econômico e financeiro a longo prazo. Também não realizamos a reforma agrária e a universalização das políticas sociais, sem as quais não há condições materiais para combinar crescimento econômico com elevação do bem-estar social. Com o fim do ciclo de valorização dos produtos primários, que causou a diminuição da renda nacional, não seria mais possível distribuir para os pobres sem taxar os ricos, o que provocou uma mudança na atitude de aceitação do grande capital em relação às políticas distributivistas, pois não é mais possível distribuir para os pobres sem taxar os ricos. Além disso, o oligopólio financeiro privado não investiu na produção, forçando o governo a realizar manobras protelatórias como: manutenção de uma política ortodoxa de juros e cambial; utilização da Petrobras como dinamizador dos investimentos em logística; desonerações contra a “greve de investimentos”, na expectativa de que o empresariado privado respondesse com manutenção de empregos, ampliação na produção e redução nos preços.
 
No período do primeiro mandato do governo Dilma, o grande empresariado, inclusive os setores que haviam apoiado a política de conciliação, reclamavam uma mudança fundamental na “política econômica”, de modo que o governo revertesse a ampliação do salário direto e indireto da classe trabalhadora. Como isto não ocorreu, o resultado foi o deslocamento de setores cada vez mais amplos do grande capital em favor da oposição. Este movimento já havia sido antecipado pelos setores médios, em 2005, na chamada crise do “mensalão” e, a partir do segundo semestre de 2013, pelas camadas populares. A disputa eleitoral ainda não se interrompeu, pois o problema de fundo é que a atual situação política, econômica e social não agrada a nenhuma das classes fundamentais da sociedade brasileira. Há uma situação de impasse estratégico, institucional e, também, de concepção de Estado – entre um modelo com mais recursos para investir na saúde, educação, assistência social e no desenvolvimento econômico, ou outro, como regulador dos conflitos sociais e econômicos.
 
Ubiratan Félix, Professor do IFBA , Presidente do SENGE –BA e Diretor da APUB
 
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