Engenharia de Alimentos: passado, presente e perspectivas

Engenharia de Alimentos: passado, presente e perspectivas

A engenharia de alimentos é uma área de conhecimento relativamente jovem. O primeiro curso na área de tecnologia de alimentos foi criado no Brasil apenas em 1967 – era também o primeiro da América Latina. Sediada na Universidade Federal de Campinas – Unicamp, a Faculdade de Tecnologia de Alimentos só passou a se chamar engenharia de alimentos em 1975. Hoje, de acordo com informações da Associação Brasileira de Engenheiros de Alimentos – ABEA existem mais de 70 instituições de ensino que oferecem o curso no país.

Na Bahia, os estudantes podem escolher entre a Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia –UESB (campus de Itapetinga) e a Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS, cujo curso completou recentemente 15 anos de existência. Fundado em 1998, ele começou a funcionar no dia 1º de março de 1999 e obteve reconhecimento do Conselho de Educação do estado da Bahia em março 2004, antes mesmo de formar sua primeira turma.

Professores e Laboratórios

Como todo novo curso, os primeiros anos foram marcados por adaptações, ajustes e desafios. Era necessário encontrar os professores adequados e sanar – ou, pelo menos, minimizar – os problemas de infraestrutura. A professora Cristina Rodrigues da Silva, doutora em Ciência de Alimentos pela Unicamp e uma das primeiras docentes a assumir a turma da UEFS, relembra: “tínhamos apenas um laboratório que dava suporte para todas as aulas práticas. Éramos poucos professores, então iniciamos as solicitações de professores visitantes. Lembro de convidar a professora Elisa Teshima e, tão logo a mesma foi contratada, recebemos a incumbência de esboçar os laboratórios necessários para as aulas práticas dos diversos componentes curriculares.” A própria professora Elisa Teshima, engenheira de alimentos e Doutora em Ciência e Tecnologia de Alimentos pela Universidade Federal de Viçosa – UFV, concorda: “a cada semestre era necessária a implementação de componentes curriculares novos, mais específicos da área de alimentos e isso demandava contratação de novos professores, bem como a necessidade de laboratórios específicos.”

A reitora da UEFS na época, Anaci Bispo Paim confirma: “A dificuldade maior, de início, foi a formação do quadro docente e a instalação dos laboratórios, mas logo após a implantação do curso, realizamos concurso público para novos ingressos”.

Para construir os laboratórios foi indispensável, além do apoio da reitoria, a busca por financiamento junto a órgãos de fomento à pesquisa. “Os primeiros projetos de infraestrutura de laboratórios, submetidos à FAPESB, nos possibilitou equipá-los com o básico para as aulas práticas. Equipamos os laboratórios com recursos da UEFS, do CNPq e da FAPESB, aos quais submetemos os projetos de pesquisa.”, diz Cristina.

“Enfim, foi um período de intenso trabalho”, resume Elisa, mas as duas professoras acreditam que a experiência foi gratificante, que rendeu frutos. “A expectativa de crescimento de um pólo agroindustrial em Feira de Santana e a demanda por engenheiros de alimentos bem qualificados foi o impulso para vencer os obstáculos”, diz Elisa. Cristina completa: “hoje temos 15 laboratórios (Processamento de alimentos, Qualidade, Química de alimentos, Análise físico-química, Desenvolvimento de novos produtos, Análise sensorial, Embalagens, Panificação, Fermentação, Operações unitárias, Simulação de processos, Carnes, Biotecnologia, Engenharia bioquímica e Transmissão de calor e massa) e contamos com 20 professores nas áreas específicas de Engenharia de alimentos e Ciência e Tecnologia de Alimentos”.

Apesar dos avanços, ainda hoje existem dificuldades a serem superadas, especialmente na manutenção dos equipamentos e aquisição de outros mais modernos, que possam acompanhar o acelerado crescimento tecnológico. “Mesmo com 15 anos de curso, ainda temos deficiências de infraestrutura. Necessitamos desde equipamentos básicos como alguns mais avançados.”, afirma Elisa.

Evolução e Tecnologia

A importância de estar em dia com as novas tecnologias é uma realidade para a maioria das profissões. No caso da engenharia de alimentos, esse conhecimento é indispensável. Hoje, os consumidores estão mais atentos e exigentes em relação à qualidade e segurança dos alimentos e o engenheiro de alimentos precisa estar atento a esta tendência. “A demanda do mercado atual por alimentos com menos gordura, sal, açúcar ou com mais fibras, são exemplos da necessidade constante de desenvolvimento de novos ingredientes ou processos para criar novas formulações ou equipamentos, de tal forma que o ensino em engenharia de alimentos também precisou acompanhar as mudanças”, diz Cristina.

Quem conhece de perto essas mudanças é a engenheira de alimentos Cleide Guedes, gerente de Alimentos e Bebidas do Campus Integrado de Manufatura e Tecnologia, SENAI Unidade CIMATEC. Inaugurado em 2002, o CIMATEC atua na formação de profissionais para diversas áreas da indústria. No caso do setor de Alimentos e Bebidas, ele oferece cursos de aperfeiçoamento e qualificação para estudantes e profissionais da área, além de cursos de pós-graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos, e Gestão da Qualidade na Indústria de Alimentos. De acordo com Cleide, existe hoje no mercado uma demanda por comidas mais saudáveis e, em consequência disso, ocorre “a entrada de tecnologias inovadoras com a finalidade de reduzir o impacto do processamento industrial nas características sensoriais e nutricionais dos processados. Podemos citar o uso da esterilização a frio (ultrassom, extração supercrítica, ultrafiltração), incremento de novas tecnologias de secagem (liofilizadores, spray dryer), dentre outras. Tudo isso demanda a contínua atualização dos profissionais.”, completa.

Atualização constante, dinamismo, organização e visão estratégica são algumas das habilidades que os profissionais dessa área precisam desenvolver. Para aqueles que conseguem, o mercado tem recompensado, ainda que lentamente. “[Na Bahia] A profissão está se expandindo devido ao avanço tecnológico das indústrias de alimentos, necessidade de novas transformações nas atividades de produção, reformulação de tecnologias empregadas e para o atendimento às novas exigências de padronização, controle de qualidade dos  produtos e inovação” – diz Cleide. E completa: “Além disso, observa-se, cada vez mais, a inserção de profissionais nas áreas de biotecnologia e docência em instituições de ensino superior”.

Mais ainda, nos últimos anos, algumas empresas de grande porte – como Nestlé, Pepsico, e a cervejaria Itaipava – se instalaram na Bahia, abrindo mais uma frente no mercado de trabalho do estado para os engenheiros de alimentos.
O crescimento da indústria é uma tendência em todo o país. De acordo com dados da Confederação Nacional da Indústria – CNI, o setor alimentos apresentou, no primeiro trimestre desse ano, crescimento de 7,3% no número de empregos em relação ao mesmo período do ano passado. Foi a maior alta entre os 21 setores industriais pesquisados. Em segundo lugar, vem “equipamentos de transporte”, com alta de 5,2%, seguido por “madeira”, com 3,7%.

Apesar da expansão, é necessário atentar para o cumprimento do piso salarial dos profissionais, que é de seis salários mínimos (para uma jornada de seis horas). De acordo com a engenheira de alimentos Márcia Nori, Mestre em Ciências dos Alimentos pela USP e vice-presidente do Sindicato dos Engenheiros da Bahia, “apesar do crescimento da indústria de alimentos ainda há uma defasagem na remuneração do setor, possivelmente devido ao desconhecimento da lei nº 4950 – A, que determina o piso salarial dos engenheiros”. A lei está em vigor desde 1966 – somente um ano mais jovem que o primeiro curso de tecnologia de alimentos do país – e, assim como a própria engenharia de alimentos, tem avançado, mas ainda há um longo caminho a percorrer.

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