Todos os integrantes do MST participam de algum coletivo, núcleo de
base ou território, inclusive as crianças. Essa diretriz baseia-se no
reconhecimento da força resultante da união dos trabalhadores, que, do
contrário, isolados, ficariam enfraquecidos. “O trabalhador isolado não
tem perspectiva no campo”, afirma Djacira Araujo, uma das primeiras
militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) a
entrar na universidade e concluir o mestrado na Faculdade de Educação da
UFBA (Faced), que acaba de lançar o livro “Pedagogias do Movimento Sem
Terra e Relações de Gênero: incidências, contradições e perspectivas em
movimento”, da editora Lutas Anticapital. A obra resulta de sua
dissertação, defendida em 2011.
O lançamento, no dia 15 de abril, integrou a programação da VI
Jornada Universitária em Defesa da Reforma Agrária que acontece na UFBA
entre os dias 04 e 26 deste mês, com uma programação que inclui mesas de
debates, lançamentos de livros, curso de capacitação, atividades
culturais e a já tradicional feira agroecológica. A Jornada integra o
Abril Vermelho, mês dedicado às lutas pela reforma agrária, que promove
uma série de atividades que mobilizam universidades federais, estaduais,
particulares e institutos de ensino de todo o país.
“É uma alegria fazer o lançamento do livro na UFBA, na Faced, onde
estudei. Sou uma exceção no movimento Sem Terra que conseguiu entrar na
academia e concluir o mestrado. A UFBA me acolheu”, agradeceu Djacira,
que é natural do Piauí e faz parte do do MST desde 1989. Tornou-se uma
das dirigentes do movimento e coordenou a Escola Nacional Florestan
Fernandes por muitos anos. O texto baseia-se em sua experiência de três
décadas no movimento, aliada ao acúmulo teórico obtido junto à
universidade e suas vivências no campo educacional.
A autora fala da práxis pedagógica do MST como uma forma de
organização coletiva no campo e de resistência prática e teórica a uma
pedagogia hegemônica de exploração e destruição do campo. “Defendemos
valores humanistas e socialistas, como solidariedade, cooperativismo,
práticas sociais éticas no campo e relações mais justas entre homens e
mulheres”, disse. Djacira sugere a união aos trabalhadores da cidade e
do campo em torno de pautas comuns, como a luta contra a reforma de
previdência, as ameaças contra a democracia, a luta social e as
lideranças da classe trabalhadora.
Em tempos de barbárie com a ofensiva do pensamento ultraconservador e antidemocrático, o livro traz perspectivas de novas formas de viver e se relacionar, incluindo as relações de gênero que estão permeadas pelas relações de poder na sociedade. Ela avalia que é preciso lutar contra o patriarcado, o machismo e todo tipo de violência e opressão de gênero e raça/etnia. “A sociedade exerce uma violência muito grande contra as mulheres, especialmente as mulheres negras, que são o grupo social historicamente mais explorado pelo sistema colonial”.
“Mais de 130 lideranças políticas foram assassinadas nos últimos dois
anos”, recordou Djacira, denunciando a violência no campo e as chacinas
de camponeses, sinalizando também a ofensiva contra as terras indígenas
e quilombolas. “Esse governo incentiva a violência no campo, armando
fazendeiros e milicianos”, afirmou, argumentando contra as ações de
criminalização dos movimentos sociais, o encarceramento da população
negra e das periferias e a retirada de direitos para aumentar a
exploração dos trabalhadores.
Djacira Araujo ressaltou a importância dos debates sobre a Reforma
Agrária nas universidades, que ela acredita ser fundamental para pensar
um projeto de país mais justo, com menos desigualdades. Na sua
avaliação, a luta pela reforma agrária segue atual e urgente diante de
uma contradição histórica não enfrentada pelo país, que é a enorme
concentração de terras nas mãos de poucos.
“O modo de produção colonial instalado no campo permanece, de alguma
forma, até os dias atuais”, disse, condenando os recentes cortes no
Programa de Aquisição de Alimentos para agricultura familiar e dos
recursos para obtenção de terras por famílias acampadas. Ela também
avalia como um retrocesso muito grande a transferência do Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para o Ministério da
Agricultura, atualmente comandado por representantes do agronegócio e
fazendeiros.
Além disso, questionou o apoio governamental para anistiar dívidas
milionárias de grandes fazendeiros com fundos públicos, ao passo em que
não há políticas de financiamento para pequenos produtores. Esse apoio,
no seu entendimento, também tem sido decisivo para liberar novos
agrotóxicos no mercado em quantidade recorde em apenas três meses de
governo.
Por fim, Djacira ressaltou a importância do trabalho de base e de aglutinar as forças de esquerda e dos movimentos sociais em torno de causas importantes como a reforma da previdência, que, se aprovada, prejudicará os trabalhadores e as trabalhadoras do campo sobretudo.

Abril Vermelho
No Abril Vermelho, mês dedicado às lutas pela reforma agrária, uma
série de atividades mobilizam universidades federais, estaduais,
particulares e institutos de ensino de todo o país. A VI Jornada
Universitária em Defesa da Reforma Agrária acontece na UFBA entre os
dias 04 e 26 de abril, com uma programação que inclui mesas de debates,
lançamentos de livros, curso de capacitação, atividades culturais e a já
tradicional feira agroecológica.
De acordo com professora da Faculdade de Educação Celi Taffarel, que
está na coordenação da Jornada na UFBA, mais de 40 universidades
participam do evento em 2019, que nesta edição tem como tema ““Lutar,
Construir Reforma Agrária Popular! Ninguém Solta a Mão de Ninguém”. A
Jornada Universitária marca do Dia Internacional de Luta Camponesa, 17
de abril, e denuncia a impunidade do massacre de Eldorado dos Carajás,
no Pará, em 1996, quando 19 trabalhadores rurais Sem Terra foram mortos
pela Polícia Militar – também em um dia 17 de abril.
“O Brasil tem uma estrutura fundiária que tem raízes nas capitanias
hereditárias – que dividiram o território brasileiro em grandes
extensões de terras concedidas aos colonizadores. Hoje precisamos
quebrá-las e fincar novas raízes numa perspectiva solidária de
repartição das riquezas e preservação do planeta. Por isso é fundamental
a reforma agrária. Por isso é necessária a agroecologia. Trata-se de um
projeto histórico que busca superar as contradições do capitalismo que
está destruindo a humanidade”, afirma Celi Taffarel.
O evento tem como objetivo incentivar o compromisso das universidades
brasileiras com a questão da reforma agrária, visibilizar as ações de
luta pela terra, fortalecer a produção teórica sobre esse campo do
conhecimento e denunciar os ataques aos camponeses do Brasil, afetados
por medidas como a redução de créditos para a agricultura familiar e o
projeto de reforma da Previdência que acaba com a aposentadoria rural. A
defesa da alimentação saudável, livre de agrotóxicos e transgênicos
também integra a pautas de reivindicações da Jornada.
Os dados do Caderno de Conflitos no Campo Brasil 2018 recentemente
anunciados pela Comissão Pastoral da Terra serão tema do evento
promovido pelo grupo de pesquisa Geografar (A Geografia dos
Assentamentos na Área Rural), no dia 25 de abril, às 14 horas, na
Faculdade de Economia, na Piedade. O Caderno lançado no último dia 12,
na Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), no Distrito
Federal, revela o aumento de 35,6% na violência no campo no ano passado,
com quase um milhão de pessoas envolvidas (960.640). Os dados completos
estão disponíveis na página da Comissão Pastoral da Terra.
Entre as atividades realizadas, no último dia 18, assentados de áreas
de reforma agrária e estudantes da turma de Atividade Curricular em
Comunidade e em Sociedade Mata Urbanas (ACCS BIOC78), do Instituto de
Biologia, participaram de curso de capacitação técnica em Agroecologia
no assentamento Terra Vista, localizado em Arataca, no Sul da Bahia.
A programação do evento segue até o próximo de 26 de abril. O
fechamento das escolas do campo será tema de outro importante debate que
acontecerá no dia 25/04, às 13 horas, na Faced, com o tema “O
fechamento de escolas e formação de professores: as contradições frente
às questões agrárias, dos direitos humanos e da defesa da educação
pública”.
A Jornada Universitária em Defesa da Reforma Agrária é organizada pelos grupos de pesquisa e estudos Geografar (A Geografia dos Assentamentos na Área Rural), LEPEL (Linha de Estudo e Pesquisa em Educação Física & Esporte e Lazer), LEMARX (Laboratório de Estudos e Pesquisas Marxistas), GEPEC (Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação do Campo da UFBA), NEPA (Núcleo de Estudos e Práticas em Práticas Agrárias) NERA (Núcleo de Estudos Regionais e Agrários da UFBA), Atividade Curricular em Comunidade e Sociedade Mata urbanas (ACCS BIOC78) e Ações Interdisciplinares em Área de Reforma Agrária (ACC EDCD 456).
Fonte: Edgar Digital